Claustrofobia? Talvez. A cada segundo que passa eu me sinto mais sufocada em mim e de mim mesma. Não quero chorar, não quero sofrer! Quanto mais o tempo passa, mais eu quero sumir. Empurrões, batuques, palavras e mais palavras... Chega!
Viro e me desviro com cuidado para não atrapalhar a senhora que dorme ao meu lado.
Algo chama a minha atenção no meio disso tudo: um bebê.
Ah, como eu queria ser um bebê... Sinto uma leve e branda inveja desses pequenos seres.
Ele está dormindo nos braços cansados de sua mãe que, por sua vez, está cansada de seus braços pesados.
Bebês são as criaturas mais privilegiadas que existem. E o ciclo é sempre o mesmo. Não existem problemas ou complicações na vida de um bebê, tudo sempre são flores. Ele acorda e come, come e acorda. Um bebê recebe todo amor e carinho do mundo, como se, a qualquer instante, algo fosse impossibilitar bruscamente a demonstração da compaixão que ainda existe dentro do ser humano.
Para um bebê virar algo fofo e encantador, alguém tem de sofrer – alguém sempre tem de sofrer – e, o bebê, lá no princípio do mundo, escolheu que esse alguém seria a sua mãe. Desde antes de o bebê ser algo que lembre a fisionomia de um bebê, a mãe inicia seu sofrimento. Dores, enjoos, restrições, privações. Depois as coisas só pioram: dor na coluna, barriga imensa, muitos quilos a mais, roupas que não lhe servem mais, pés e rostos inchados. Muito dinheiro gasto consigo mesma e com o pequeno embrião milimétrico. Além disso, ainda tem de aturar estranhos acariciando a região abdominal de seu corpo a todo o tempo.
[Ah, bebê... Quanto poder você tem! De onde ele vem?]
Nunca pensei que alguém iria querer passar por tudo isso e sem reclamar.
Mães sofrem. A mulher já nasce para sofrer. Trabalha, limpa a casa, se depila, cozinha, cuida do bebê.
[Ah, bebê... Quanto poder você tem! De onde ele vem?]
O mais curioso de tudo isso é que a mulher já nasce querendo ser mãe. A mulher já nasce querendo sofrer.
As pessoas quando se aproximam de um bebê só querem uma coisa: brincar com o motivo do sofrimento alheio enquanto ele está calmo e sorridente. Quando um bebê suja a fralda ou começa a chorar, ele volta para sua mãe e a mãe, por sua vez, é voltada, forçadamente, para mais sofrimento.
Não importa quem é a pessoa, mas quando esta olha pra um bebê, fica hipnotizada, encantada! E o acompanha com o olhar para aonde quer que ele vá.
Incrível é como o sofrimento consegue ser infinitamente menor do que a alegria sentida pelas mães.
O bebê é um ser tão genial que consegue o amor de sua mãe apesar disso tudo!
[Ah, bebê... Quanto poder você tem! De onde ele vem?]
Podem ser grandes, pequenos, carecas, cabeludos, brancos, pretos, gordos ou magros: bebês são sempre lindos e amados.
O seu poder de hipnose é tão grande que dificilmente acharemos que um bebê é feio – por mais que ele realmente o seja. Bebês são sempre lindos. Ao passo que essa verdade é irrefutável, as mães ficam cada vez mais feias e acabadas. Cada vez menos têm tempo para cuidarem de si. Descabeladas, unhas por fazer, as mesmas roupas sendo repetidas durante três dias seguidos, zero maquiagem, quem dirá depilação...!
Mães são guerreiras. Passam por tudo isso sem reclamar. Estão sempre com um sorriso estampado no rosto surrado de sofrimento. Estão sempre orgulhosas de seus bebês.
[Ah, bebê... Quanto poder você tem! De onde ele vem?]
Um bebê, mesmo quando planejado, é uma coisa imposta, forçada. Bebês são tão poderosos que conseguem fazer com que as mães fiquem felizes em engordar tanto em um período tão curto de tempo. Bebês fazem questão em ficar acordados durante a noite inteira chorando só para terem a certeza de que não serão abandonados pelas mães. Enquanto isso, as olheiras, mau humor, gordura localizada só aumentam. Bebês sabem que serão atendidos com o soar de um curto e fino choro.
A maior qualidade de um bebê é ser capaz de colocar uma mãe a mais no mundo. Um mundo sem mães seria um mundo perdido. Um mundo sem mães seria um mundo sem amor, compaixão, sensibilidade, cumplicidade, colos em dias de chuva...
Obrigada, bebê por ser capaz de criar mães mesmo antes de nascer.
Inveja de um bebê? Sim. Um pouco. Queria ter um pouco desse imenso poder. Seria muito útil para mim.
Bebês, bebês e mais bebês...
Desço do ônibus e o pensamento sobre bebês se perde entre os prédios e carros dessa avenida engarrafada por bebês.